Ex-ministra colombiana torna sonhos “visíveis”

“Não há nada nesse mundo que não te pertença.” Quando pequena, Paula Moreno Zapata ouviu essa frase muitas vezes de sua avó. Poderia ser uma simples mensagem motivacional, se o contexto não fosse tão adverso: sua família morava na Costa Pacífica da Colômbia, região que possui um dos menores índices de desenvolvimento humano do país. Mas a fé nas palavras de sua progenitora, aliada a uma sagacidade admirável, levou a jovem de 34 anos a se tornar a primeira ministra negra da história da nação latino-americana.

Paula Moreno Zapata: primeira ministra negra da história da Colômbia

Fundadora da ONG Manos Visibles (“Mãos Visíveis”), que luta pela reintegração social de jovens e mulheres em situação de risco, Paula visitou o Viva Rio para um intercâmbio de experiências.  Foi recebida pela equipe de Segurança Humana, chefiada por Ubiratan Ângelo.

O trabalho social é parte da vida da humanitarista há bastante tempo. Aos 12 anos, já atuava como formadora de adolescentes líderes em comunidades da periferia colombiana.  Um dos principais problemas que encontrava nos grupos discentes era a autoexclusão. “Era difícil fazê-los acreditar que não existem lugares pré-determinados a essa ou àquela camada da população. A sociedade impõe a ideia de separação e muitos absorvem”, relata.

Os anos de Ensino Superior afastaram-na da atividade voluntária, mas seu foco permaneceu nas Ciências Humanas. Paula optou por cursar Engenharia Industrial na Universidade Autônoma da Colômbia para, em suas próprias palavras, “buscar certas respostas”.  “Percebi que sobravam análises e faltava pragmatismo na abordagem dos temas sociais. Quem é excluído, quer propostas concretas para deixar essa condição”.

Após terminar a graduação, teve a oportunidade de expandir seus estudos na Universidade de Cambridge, graças a uma bolsa de desempenho para alunos de alto rendimento. Permaneceu como pesquisadora da instituição britânica por pouco mais de um ano, quando recebeu o convite para assumir o Ministério da Cultura da Colômbia. Segundo ela, o fato de ter sido a primeira negra a ocupar um cargo de alto escalão num país onde os afrodescendentes já ultrapassam os 10 milhões mostra, por si só, o nível de segregação.  No entanto, nunca se limitou à posição de “representante das minorias”. “Eu era um símbolo da parcela negra da população, sim, mas meu objetivo sempre foi a interação”.

Em três anos e meio de mandato, reforçou a necessidade de valorização da cultura como um fator determinante para o crescimento do país, combatendo a visão “decorativa” geralmente atribuída ao segmento. Construiu bibliotecas e espaços de expressão artística, mesmo esbarrando na dificuldade de integração do setor ao sistema econômico do Estado. “Não há um planejamento de inserção cultural na Colômbia”, pontua.

Paula deixou a pasta em 2010, porém decidiu reunir seu expertise nos segmentos público e acadêmico para criar a ONG Manos Visibles. O nome faz alusão ao termo “mãos invisíveis”, difundido pelo filósofo Adam Smith (1720-1796) no livro “A Riqueza das Nações”, num raciocínio inverso. Na concepção da ex-ministra, o setor social precisa de “forças” programáticas independentes que garantam a formação de líderes através do mapeamento de áreas de vulnerabilidade e a implementação de planos de desenvolvimento local.

A entidade prioriza organizações de jovens e mulheres, além de comunidades afro. Os cursos são ministrados por acadêmicos, juristas, jornalistas e executivos de renome, com o intuito de conectar realidades antes vistas como totalmente opostas. “Os alunos percebem que não só podem se espelhar em seus professores, mas têm muito a dizer a eles. O aprendizado acaba sendo para ambos os lados”. Os beneficiados aplicam e multiplicam o conhecimento adquirido em seu campo de atuação. Através de parcerias com universidades e bancos, são concedidas bolsas de estudo àqueles que apresentam maior potencial. “Sempre que chegamos a uma região de risco,vemos que o advogado é de fora, o psicólogo também, e assim por diante. Queremos reverter esse quadro e qualificar a mão de obra local”.

São mais de 300 os formados pela Manos Visibles. Paula espera que esse número cresça à medida que os trabalhos ganham mais notoriedade e atraiam diferentes parceiros.  “Nunca minha avó sonhou que alguém da família fosse tão longe. Mas é como se eu estivesse passando adiante tudo que ela me ensinou”, admite.

 (Texto: Karla Menezes/Fotos: Roberta Machado)

 

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