Musicoterapia e saúde mental: como a música é utilizada no tratamento de pacientes nos CAPS

Nesta sexta-feira (15), Dia do Musicoterapeuta, conheça o trabalho de Andréa Farnettane no Centro de Atenção Psicossocial João Ferreira Filho, no Complexo do Alemão 

Andréa Farnettane, diretora e musicoterapeuta do CAPS João Ferreira Silva Filho 

 

Promover o bem-estar emocional, exercitar a memória e a elaboração cognitiva, ajudar a lidar com os sentimentos, entre eles os sofrimentos e tristezas, promover pertencimento, estimular cognitivamente, melhorar a comunicação e habilidades sociais, reduzir estresse e dor e desenvolver a coordenação motora. Esses são alguns dos benefícios proporcionados pela musicoterapia, que utiliza recursos sonoros (sons, melodias e instrumentos) como ferramentas para tratamento. 

No âmbito da saúde mental, com a reforma psiquiátrica e os novos princípios éticos e médicos, diferentes abordagens e métodos foram sendo incorporados ao cuidado com pacientes com transtornos mentais, entre eles a musicoterapia, que é aplicada nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Essas unidades atendem pessoas com transtorno mental severo e persistente ou decorrentes do uso prejudicial de álcool e/ou outras drogas. 

Sem críticas e preconceitos em relação aos seus atendidos, a musicoterapia garante liberdade para que produzam novos sons e conheçam músicas, o que leva ao autoconhecimento. É o que explica a musicoterapeuta Andréa Farnettane, diretora do CAPS João Ferreira Silva Filho, unidade sob gestão do Viva Rio no Complexo do Alemão, na Zona Norte. 

Sala do CAPS João Ferreira onde acontece o grupo de musicoterapia 

 

“Em uma sessão de musicoterapia procuro conhecer a história de vida e a história sonora musical do paciente. Peço que traga alguma música ou ofereço alguma que ele goste. Através disso consigo começar a cuidar do emocional e das dores e sofrimentos que observo. Os recursos sonoros musicais — que podem ser canções conhecidas ou desconhecidas, improvisação musical e toque de instrumentos, por exemplo — servem para que a pessoa se expresse e assim eu possa trabalhar o que ela mais necessita”, conta. 

Andréa tem envolvimento com a música desde criança, quando fazia aulas de piano e violão. Sua paixão pela música e pelo cuidado com as pessoas a fez escolher a profissão, que segue há mais de 25 anos. Se formou pelo Conservatório Brasileiro de Música em 1993 e atua em CAPS desde 1998. Na unidade João Ferreira Filho já trabalha há 13 anos. Também é compositora e tem um álbum, o “Devaneios”, feito em parceria com 21 músicos. 

A musicoterapeuta relata que os pacientes conseguem enxergar a si e ao outro, além de serem capazes de controlar suas emoções e elaborar o que estão sentindo. Nos CAPS também acontecem as sessões em grupo com pacientes psicóticos e neuróticos graves, que são abertas, realizadas uma vez por semana. Andréa desenvolve esse trabalho desde 1998, quando foi convidada a participar da implantação da musicoterapia nos Centros de Atenção Psicossocial. 

 

“Pagode na Varanda”, que acontece toda quarta-feira no espaço de convivência da unidade, aberta a todos 

 

“Conhecendo o histórico de cada um, pergunto qual música gostariam de ouvir, cantamos juntos, conversamos sobre o que ela traz de lembranças, além de oferecer instrumentos para tocarem. Olhando de fora parece uma bagunça, algo desritmado, mas ali eu observo diversas questões, como a forma de pegar no instrumento, o que o paciente fala daquela música, qual o sofrimento trazido e se ele se emociona. No grupo é trabalhada a interação uns com os outros, além da crise, que pode ser amenizada, até mesmo com ajuda de outros participantes”, explica. 

Um dos pacientes que pode atestar os benefícios do grupo é o M., que tem esquizofrenia e frequentemente ouve vozes em sua mente. “Eu não posso viver sem esse grupo, porque esqueço das vozes quando estou aqui. É tão prazeroso para mim porque eu canto, falo, trago minhas músicas, troco experiências com o outro e brinco”, relata. 

No CAPS João Ferreira também acontece o “Pagode na Varanda”, às quartas-feiras, com músicas de samba e pagode, aberto para todos os pacientes que frequentam a unidade. 

Andréa conta que no começo do grupo de musicoterapia era difícil as pessoas se abrirem por serem reprimidas em seu território, marcado pela violência. Mas, aos poucos, perceberam que poderiam se expressar sem medo de serem julgados. “Os grupos fortalecem o vínculo com o terapeuta, entre os pacientes e com o serviço, já que eles sabem que podem procurar atendimento e serão escutados. Eles se sentem acolhidos e seguros”, finaliza a profissional.

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