Uma lista de sete argumentos, criada pela Frente Parlamentar pelo Controle de Armas pela Vida e pela Paz, bombardeia o substitutivo ao Projeto de Lei (PL) 3722, que pretende revogar o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826). Segundo o Mapa da Violência 2015, um estudo do Governo Federal, feito em parceria com a UNESCO, o Estatuto salvou 160.036 vidas em 10 anos. A Frente é formada por 273 deputados de diferentes partidos.
O Viva Rio teve acesso ao documento através do sociólogo da instituição, Antonio Rangel Bandeira, que está em Brasília acompanhamento o julgamento no Congresso Nacional. O texto começa com ironia: ao invés de se autodenominar “Estatuto de Regulamentação das Armas de Fogo”, o substitutivo deveria se chamar “Estatuto de Distribuição de Armas de Fogo“, tal a irresponsabilidade com que propõe a ‘oferta’ maciça de armas à população.
Se aprovado, permitirá até que criminosos condenados comprem armas e que taxistas e caminhoneiros trabalhem armados. Para o sociólogo Julio Waiselfisz, autor do Mapa da Violência, “haverá uma explosão de homicídios se essa liberação do controle de armas passar.”
Principais propostas que destroem o Estatuto do Desarmamento:
1) Permite que criminosos comprem armas, desde que seu crime tenha sido culposo (quando não há intenção de matar), e também aos que respondam a processo criminal culposo (art.16). Indivíduos processados por tráfico de armas ou de drogas poderão comprar arma. A lei atual proíbe.
2) Rebaixa de 25 para 21 anos a idade mínima para compra de armas (art. 16,I), desprezando o fato de os jovens morrerem quatro vezes mais do que os adultos por arma de fogo.
3) Na prática, acaba com a Campanha de Entrega Voluntária de Armas que, segundo o Mapa e o Instituto de Pesquisa Aplicada (IPEA), reduziu as mortes por arma de fogo em 15,4 %, após recolher 960.000 armas. Noventa e um por cento das armas recebidas eram ilegais, e só foram entregues porque a lei garante o anonimato. São as armas ilegais, muitas delas de uso militar, as mais perigosas, por não poderem ser rastreadas. O substitutivo acaba com o anonimato. Também proíbe que a sociedade civil colabore no recebimento de armas, impedindo que, como sucedeu em 2004/2005, mais de 400 igrejas de todos os credos, a Maçonaria, o Rotary Clube, sindicatos, organizações da sociedade civil, participassem de campanha reconhecida entre 40 países como a de maior participação popular.
4) O coração da lei atual é a proibição de que a população ande armada na rua (só permitindo em casos excepcionais), o que reduziu drasticamente os tiroteios no trânsito, em boates, bares, estádios de futebol etc. A proposta pretende liberar o porte, permitindo que se leve arma a cinemas, escolas, shoppings, bares, igrejas etc. Se aprovada, vai autorizar que andem armados deputados e senadores, advogados e 15 outras categorias profissionais. As dezenas de milhares de taxistas e caminhoneiros poderão portar armas em serviço, podendo levar até cinco armas em seus carros e, com autorização, até seis. A proposta autoriza, ainda, que um indivíduo leve consigo na rua até cinco armas por todo o território nacional.
5) O substitutivo diminuiria, ainda, as penas prevista para a posse ilegal, que lei atual é de um a três anos de detenção, e passaria para o período de seis meses a dois anos. Porte ilegal, com punição prevista hoje de dois a quatro anos de reclusão, passaria de um a três anos. Taxistas e caminhoneiros flagrados com armas ilegais em seus veículos não serão punidos se não tiverem maus antecedentes. Quem for detido com arma, alcoolizado ou drogado, ou for denunciado por crime violento, não perderá a arma: terá apenas o seu direito de ter arma suspenso, suspensão essa que poderá ser revogada.
6) A lei estabelece a renovação do registro de arma de três em três anos, para que seu proprietário demonstre continuar em condições físicas e mentais para usá-la (licenças para dirigir são renovadas de cinco em cinco anos), e para que se verifique que não foi vendida ilegalmente. O substitutivo torna o registro definitivo, impedindo o controle. A renovação do porte será de 10 anos, com 10 horas de treino (idem). Para tirar carteira de habilitação de veículo automotor, são exigidas 70 horas.
7) O Estatuto determina que o banco de dados do Exército repasse as informações sobre armas de atiradores, colecionadores, caçadores e armas privadas de militares e policiais para o Sistema Nacional de Armas da Polícia Federal. Frequentemente desviadas para a ilegalidade, só assim a Polícia Federal pode rastreá-las, quando envolvidas em crime ou venda ilegal. O substitutivo acaba com a determinação, tornando apenas “possível” essa transmissão de informações.
Campanha
A campanha Controle de Armas, EU APOIO, será lançada nacionalmente no Seminário Controle de Armas pela Vida e pela Paz, que acontece na sexta-feira (25/09), em Maceió, em defesa do Estatuto do Desarmamento.
(Texto: Celina Côrtes|Fotos: Paulo Barros e EBC)