Beneficiários têm menor risco de internação por transtornos relacionados ao uso de substâncias; Viva Rio realizou roda de conversa com pesquisadora da Fiocruz e profissionais da saúde e assistência
Na imagem, da esquerda para a direita: Marília Rocha, Elivanda Canuto, Thaisa Pinto, Evelyn Parente e Lidiane Toledo
Um estudo do Centro de Integração de Dados e Conhecimento para Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Cidacs/Fiocruz Bahia), em parceria com a Universidade de Harvard, aponta que beneficiários do Programa Bolsa Família, do governo federal, apresentaram um risco 17% menor de internação por transtornos relacionados ao uso de substâncias, em comparação com os não-beneficiários. O motivo é que as preocupações e incertezas sobre questões financeiras podem ser consideradas um “estressor” de natureza socioeconômica, que afeta a qualidade de vida e piora a saúde mental das pessoas. Então, as políticas de transferência de renda podem contribuir para o bem-estar da população ao amenizar esse estresse financeiro.
O Viva Rio realiza cogestão de mais de 30 unidades da Rede de Atenção Psicossocial do município do Rio de Janeiro, entre elas Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS ad), que atendem pessoas com transtornos mentais decorrentes do uso abusivo dessas substâncias. Para debater a relação entre programas de transferência de renda, saúde mental e uso abusivo de drogas, o Núcleo de Desenvolvimento Social do Viva Rio promoveu uma roda de conversa com o tema “O Bolsa Família como ferramenta de cuidado na Atenção Psicossocial”, na última terça-feira (20/05), na sede da instituição, em Ipanema.
O evento contou com a presença de Lidiane Toledo, pesquisadora do Cidacs/Fiocruz, Thaisa Pinto, diretora do CAPS ad Raul Seixas, Evelyn Parente, assistente social, Elivanda Canuto, redutora de danos, e Marília Rocha, socióloga e coordenadora do Núcleo de Desenvolvimento Social do Viva Rio, que mediou o debate.
“O alívio do estresse financeiro, o atendimento das necessidades básicas, a melhoria no status socioeconômico, o aumento do acesso à saúde e o estímulo a uma alta frequência escolar podem ser possíveis fatores que explicariam a associação de proteção entre participar do programa e a internação por uso de substâncias”, explicou Lidiane Toledo, pesquisadora associada ao Cidacs e integrante da equipe do estudo, que analisou mais de 35 milhões de pessoas, registradas entre 2008 e 2015.
A pesquisa também verificou a associação entre o Bolsa Família e as internações por tipos de substâncias. Foi observada uma redução em 26% no risco de internações por uso de álcool e 11% no risco de internação por outras substâncias, entre os beneficiários do programa quando comparados aos não-beneficiários. Portanto, para os pesquisadores, o Bolsa Família é custo-efetivo para os sistemas de saúde, ao prevenir hospitalizações.
Durante a roda de conversa, foi abordado como o programa de transferência de renda pode ser uma forma de redução de danos, sobretudo para pessoas em situação de rua, ao garantir a esses indivíduos o acesso a bens e serviços. Também é uma maneira de resgate da autoestima e da autonomia dessas pessoas, que podem pensar em outras possibilidades de vida.
“A transferência de renda é uma forma de humanizar as pessoas, dar dignidade a elas. É um clamor pelo direito ao básico. Hoje não podemos mais falar de pobreza considerando apenas o recorte de renda e sim vários outros fatores de vulnerabilidade social, que perpassam por saúde mental e uso abusivo de drogas, por exemplo. Que esse seja o primeiro encontro de muitos que aproximem essas questões”, enfatiza Marília Rocha.
Jéssica da Silva, assistente social do CAPS ad Paulo da Portela foi uma das profissionais que participou do evento. “Trazer esse debate, sobretudo na atenção psicossocial é super importante, no sentido de conseguir pensar outras formas de cuidado. Enquanto trabalhadora da assistência, percebo os impactos da falta de renda no cuidado do sujeito. Programas como o Bolsa Família beneficiam as pessoas de várias formas. Por exemplo, se o indivíduo está diminuindo o uso ou substituindo a substância que utiliza, isso impacta os serviços de saúde, ao reduzir internações e custos. O evento foi muito rico, que seja ampliado para outros espaços, alcance mais profissionais e a gente siga promovendo a intersetorialidade, que é fundamental”, comentou.
Confira abaixo mais fotos da roda de conversa.
Texto: Raquel de Paula