Acolhimento e redução de danos em debate no Viva Rio

Políticas de acolhimento ao usuário de crack e outras drogas e programas de redução de danos foram os temas predominantes nos painéis da tarde de sexta-feira, dia 6, do fórum internacional “As Ruas e as Drogas: competências e inovações”.

Um dos destaques do seminário, o diretor de Redução de Danos da Open Society Foundations, Daniel Wolfe, apresentou e comparou estratégias de atendimento e tratamento ao dependente químico adotadas por Ucrânia, Vietnam e Canadá. Na concepção do especialista, é  necessário que os profissionais de saúde e assistência social mudem alguns dos valores que sustentam suas práticas, de modo a compreender as reais demandas imediatas dos indivíduos que pretendem atender. “Os serviços devem moldar-se e adaptar-se a seu público-alvo, e não o contrário. Às vezes, é preciso deixar a abordagem clínica de lado, pelo menos no primeiro momento, e aproximar-se do usuário para entender o que é prioridade para ele”, explicou.

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“Profissionais precisam rever suas práticas e tentar compreender o que é prioridade para o usuário”, afirmou o diretor de Redução de Danos da Open Society Foundations, Daniel Wolfe

O psicólogo Rafael West complementou o raciocínio de Wolfe ao falar sobre o programa ATITUDE, iniciativa pioneira da Secretaria de Desenvolvimento e Direitos Humanos de Pernambuco cujo grande diferencial é a combinação de abordagem de rua, intervenção psicossocial e disponibilização de moradias provisórias a usuários de crack e outras drogas.”Na etapa da habitação, eles continuam sendo acompanhados diariamente, mas se comprometem a estudar, procurar um emprego ou curso profissionalizante”, explicou o coordenador do ATITUDE. Desde sua implementação, em 2011, o programa já propiciou a reintegração de mais de quatro mil pessoas em Recife e outras regiões com altos índices de homicídios. “Eles reatam laços antes perdidos e atingem a autonomia para continuar sua trajetória de vida.”

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Rafael West, coordenador do Programa ATITUDE, em Pernambuco. Iniciativa é pioneira na reintegração de usuários de crack e outras drogas

Coordenador do “Perfil dos Usuários de Crack e/ou Similares no Brasil”, divulgado pela Fiocruz em setembro deste ano, o pesquisador Francisco Inácio Bastos lembrou que muitos dependentes químicos já convivem com a falta de perspectivas antes mesmo de começarem a se relacionar com a droga. Quase 30% relataram que problemas familiares ou perdas afetivas foram a principal motivação para usar crack e 44,5% das mulheres consultadas na sondagem admitiram já terem sido vítimas de violência sexual. Uma vez que iniciam o consumo excessivo de drogas, sofrem mais perseguições e estigmatizações, principalmente dos órgãos de segurança. “Acho curioso quando a mídia noticia as que ‘usuários de crack fugiram da polícia’. Se um helicóptero repleto de homens fardados e armados voasse rente à minha cabeça, eu também sairia correndo”, ironizou.

Em seu segundo dia como palestrante no fórum, a especialista em uso problemático de drogas e assessora do governo do Uruguai Raquel Peyraube ressaltou que faltam pragmatismo e humanização no atendimento ao usuário de drogas, no entanto reconheceu os avanços obtidos ao longo do tempo. “O dependente químico já foi considerado enfermo, criminoso e doente. Hoje, estamos conseguindo apresentá-lo como ser humano. Porém, o mais difícil vem a seguir: transformá-lo em um cidadão, uma pessoa com direitos e que, assim como qualquer um de nós, passa por momentos difíceis.”

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Raquel Peyraube (de azul), especialista em uso problemático de drogas: “É preciso enxergar o usuário de drogas como cidadão.”

Também participaram dos debates o diretor do Centro de Saúde Mental e Dependência Química de Vancouver, no Canadá, Benedikt Fischer; o subsecretário de Desenvolvimento Social, Rodrigo Abel; a coordenadora técnica do Viva Rio, Fabiane Minozzo; o coordenador de Sistemas da Informação, Silvio Maffei; e o chefe da Coordenadoria da Área Programática 3.1, na Zona Norte da cidade, Hugo Fagundes.

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