Quando Rosineia dos Santos foi chamada por uma antiga colega de trabalho para lecionar na “Costurando a gente se entende”, oficina da Casa de Cultura Milton Santos, pensou: “Mas o que vou fazer lá?”. Costureira desde que se entende por gente, Nega, como é carinhosamente apelidada, não acreditava ter a didática para passar suas técnicas adiante. Três meses após o início do curso, ela tem dificuldade de deixar a sala de aula, tamanho o entusiasmo de suas alunas.
A oficina não só cativou Sereno, onde está situada a Casa, como atraiu mulheres das comunidades vizinhas – Fé, Paz e Caixa D’Água. A procura é tanta que, além das aulas propriamente ditas, foram criados os “Cantinhos da Costura”, horas livres nas quais as alunas podem utilizar o maquinário da instituição para realizar pequenos consertos. Mais do que aprendizado, o curso se tornou terapia. “Muitas chegam aqui depressivas. Conversam, falam da vida, choram em cima da máquina de costura”, revela Nega.
Entretanto, o sentimento muda à medida que as alunas se descobrem capazes. A cada ponto assimilado, é uma alegria só. “Acabo contagiada. Comemoro cada avanço das meninas como se fosse meu”, conta a mentora, que já conseguiu organizar uma aula com 15 mulheres tendo apenas oito máquinas de costura. “Foi logo no início, quando ainda não tínhamos várias turmas fechadas. Dividi as tarefas entre todas e deu certo”, lembra.
Uma das “oficineiras” mais antigas, Dona Cleusa Costa mostra-se orgulhosa de sua mais recente criação: um jogo de banheiro feito de fuxico. Ela frequenta as aulas todos os dias e já trouxe até uma das filhas. “É maravilhoso. Aprendo tanto. E a essa altura da vida, faz uma diferença”, afirma. Sua colega Rosilda Duarte até brinca: “Se deixar, fico para os horários das outras, de tanto que gosto.”
O trabalho tende a crescer, pois a Casa está prestes a fechar uma parceria com Escola de Design da PUC para que as alunas passem a ter know-how de modelagem industrial. A ideia é, no futuro, escoar a produção. “Imagina quando elas virem uma roupa feita por elas sendo comprada e usada por outra pessoa?”, deslumbra-se a professora.
A Casa de Cultura Milton Santos é uma iniciativa da Coordenadoria da Área Programática (AP) 3.1, cujas unidades de saúde são administradas pelo Viva Rio. A instituição abrange, além do “Costurando a gente se entende”, oficinas de teatro infanto-juvenil, artesanato para a 3ª idade, aulas de MMA e núcleo de mediação de conflitos. Em breve, cursos de inglês e informática também serão ministrados no local, graças a um acordo com a Federação de Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan).
A socióloga Ane Lise Vieira, coordenadora do projeto, explica que a Casa nasceu para levar noções de direitos humanos e cidadania às comunidades já atendidas pelas unidades de saúde da região. Segundo ela, um longo processo de estruturação antecedeu sua abertura oficial, o que minimizou erros. “A experiência do Hugo [Marques, coordenador-geral da AP 3.1] e do Osmar [Vargas, coordenador de Articulação do Viva Rio] foram essenciais para que começássemos a trabalhar da maneira mais estruturada possível”, conclui.
(Texto: Karla Menezes/Fotos: Renan Otto)