Sete ministros da justiça que atuaram nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso assinaram um manifesto atestando a inconstitucionalidade da criminalização do uso de drogas. O documento foi entregue pelo ex-ministro José Gregori nesta terça-feira, 16 de abril, ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes.
Os ministros signatários do manifesto são: Tarso Genro (2007 a 2010), Márcio Thomaz Bastos (2003 a 2007), Aloysio Nunes Ferreira Filho (2001 e 2002), Miguel Reale Júnior (2002), José Gregori (2000 e 2001), José Carlos Dias (1999 e 2000) e Nelson Jobim (1995 a 1997).
Gregori disse que todos os signatários ficaram insatisfeitos com as políticas sobre drogas em vigor durante suas gestões, mas que agora o Brasil está mais preparado para discutir o tema. “O fato das estatísticas criminais serem tão altas mostra que temos que reavaliar políticas, e sem dúvida uma questão muito sensível à violência é a questão das drogas”, disse.
O ex-ministro defende a extinção da prerrogativa policial de determinar quais são as quantidades para consumo próprio e para tráfico. Ele acredita que o STF pode explicitar esses limites ao julgar processo sobre o tema. Também afirmou que a descriminalização do porte de drogas para uso próprio vai diminuir o consumo de modo geral e o poder dos traficantes de drogas. “Vai diminuir o consumo e vai diminuir o poder de quem tira proveito das drogas, porque vamos atuar naquele que é suscetível, no resgate de mudança de atitude em relação ao usuário”, disse.
O ministro Gilmar Mendes foi procurado por ser relator de um recurso que ganhou, em 2011, status de repercussão geral – ou seja, a decisão nesse caso será aplicada a todos os demais processos sobre o mesmo tema no próprio tribunal e em instâncias inferiores.
A entrega da carta ocorreu em um momento-chave da discussão sobre mudanças na lei de drogas pelo Congresso Nacional. Esta ação reforça a campanha “Lei de Drogas: é preciso mudar” – amparada pela Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia (CBDD), Viva Rio, Associação Nacional dos Defensores Públicos (ANADEP), Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e Avaaz -, e as recomendações da Comissão Global de Políticas sobre Drogas e da Rede Pense Livre: Por uma Política de Drogas que Funcione.
Abaixo a carta:
Rio de Janeiro, 16 de abril de 2013.
Ao Excelentíssimo Senhor Gilmar Ferreira Mendes
Ministro do Supremo Tribunal Federal
Assunto: Manifesto pela inconstitucionalidade da repressão penal ao porte de drogas para uso próprio.
Excelentíssimo Senhor Ministro,
Considerando que o Brasil é um Estado constitucional fundado na dignidade humana e na pluralidade política, e que cada cidadão tem liberdade para construir seu próprio modo de vida desde que respeite o mesmo espaço dos demais, não é legitima a criminalização de comportamentos praticados dentro da esfera de intimidade do indivíduo, que não prejudiquem terceiros.
Por isso, os subscritores da presente – todos ocupantes da cadeira de Ministro de Estado da Justiça – manifestam sua posição pela inconstitucionalidade da repressão penal ao porte de drogas para uso próprio.
O fracasso da guerra às drogas baseada na criminalização do consumidor revela a impropriedade das estratégias até hoje utilizadas. Tratar o usuário como cidadão, oferecendo-lhe estrutura de tratamento, por meio de políticas de redução de danos, é mais adequado do que estigmatiza-lo como criminoso.
Experiências em Portugal, Espanha, Colômbia, Argentina, Itália, Alemanha, dentre outros, demonstram que a descriminalização do uso de entorpecentes foi um importante passo para racionalizar uma política de combate ao narcotráfico que não transforme a principal vítima do produto ilícito no objeto da persecução penal. O usuário de drogas merece respeito e acesso a tratamento digno, e não as barras dos tribunais.
Diante do exposto, os subscritores se somam às manifestações encartadas nos autos do Recurso Extraordinário 635.659, para requerer a esta Corte o reconhecimento da incompatibilidade do crime de porte de drogas para consumo pessoal com o modelo constitucional vigente, pautado na dignidade humana, na pluralidade politica e no respeito à intimidade e à vida privada dos cidadãos.
Tarso Genro
Ministro da Justiça, entre 16/03/2007 e 10/02/2010
Mandato do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva
Aloysio Nunes Ferreira Filho
Ministro da Justiça, entre 14/11/2001 e 03/04/2002
Mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso
José Gregori
Ministro da Justiça, entre 14/04/2000 e 14/11/2001
Mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso
Márcio Thomaz Bastos
Ministro da Justiça, entre 01/01/2003 e 16/03/2007
Mandato do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva
Miguel Reale Júnior
Ministro da Justiça, entre 03/04/2002 e 10/07/2002
Mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso
José Carlos Dias
Ministro da Justiça, entre 19/07/1999 e 14/04/2000
Mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso
Nelson Jobim
Ministro da Justiça, entre 01/01/1995 e 08/04/1997
Mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso
Com informações da Agência Brasil e Rede Brasil Atual