Com o Estatuto do Desarmamento na mira da bancada da bala, entidades da sociedade civil já se mobilizaram para evitar o que chamam de “retrocesso”. O Movimento Vida em Paz, em parceria com o Viva Rio, o Instituto Sou da Paz, o Conselho de Direitos Humanos/RN, entre outras instituições realizam no dia 3 de julho, na Assembleia Legislativa do Ceará, o “Seminário Controle de Armas – Eu Apoio”.
Entre os palestrantes está um dos fundadores do Viva Rio, Tião Santos, que enfatiza a importância deste espaço de reflexão e de debate em um momento em que se instaura uma onda de conservadorismo que tenta acabar com o Estatuto do Desarmamento. “A lei provou em sua existência que quanto menos armas circularem, mais vidas são poupadas”, diz ele.
A programação do seminário está dividida em quatro painéis: “Frente Parlamentar da Paz pela Vida”; “Porque da Efetivação do Controle de Armas no Brasil”; “As Armas no Brasil como Potencializador da Violência”; e “Construindo Cultura da Paz pela Vida e pelo Controle de Armas no Brasil”.
Este é um primeiro passo, a proposta é que o encontro seja reproduzido em outras capitais de modo que seja criada uma onda em defesa do Estatuto e pelo controle de armas no país. “Não queremos retrocessos. Os proponentes da revogação da lei propõem reduzir a idade para a aquisição de armas de 25 para 21 anos e aumentar o número permitido a cada comprador, além de autorizar a propaganda da venda no país na TV e rádio”.
Também participam do encontro Antônio Rangel, consultor de desarmamento da ONU; Marcos Dionísio Medeiros, presidente do Conselho de Direitos Humanos/RN e Ivan Contente, diretor do Movimento Sou da Paz.
82% de apoio popular
O Estatuto do Desarmamento (10.826 /03) é uma importante ferramenta no combate à extrema violência gerada por armas de fogo em todo o Brasil. Aprovado em dezembro de 2003, a lei é considerada uma das mais avançadas em nível internacional, referência para a reforma legal de pelo menos oito países na América Latina e Caribe.
Em artigo, Antonio Rangel explica que essa é uma norma avançada porque partiu da mobilização das pessoas. O fato de atingir 82% de apoio popular forçou o Congresso a aprová-la em 2003. “O seu coração é a proibição do porte de armas, isto é, o impedimento que se ande armado nas ruas. Outra medida basilar são as campanhas de desarmamento voluntário, que já tiraram de circulação mais de meio milhão de armas”, aponta Rangel.
A revogação
Somente 12 anos após a lei ter sido sancionada, uma comissão da Câmara dos Deputados vai analisar o projeto 3722/2012. Segundo o Mapa da Violência 2015, o Estatuto do Desarmamento tem ajudado a reduzir significativamente o número de mortes por arma de fogo no Brasil. Mais de 160 mil vidas foram poupadas entre 2004 e 2012, após sua aprovação, em 2003. Foi o estatuto que instituiu a realização das campanhas de desarmamento, prevendo o pagamento de indenização para quem entregasse espontaneamente suas armas, a qualquer momento, à Polícia Federal.
O Viva Rio, uma das entidades que sempre militou em sua defesa, critica a superficialidade do debate acerca do tema segurança pública, no país. Tião Santos afirma que armar a população para combater a violência fragiliza ainda mais o Estado e a Polícia. “Mesmo com todo o Estatuto, temos 60 mil homicídios por ano. Morrem mais pessoas no Brasil do que em uma guerra declarada e qualquer coisa que venha ao encontro da destruição do Estatuto é certeza de que esse número vai duplicar”.
Santos afirma que a bancada da bala nunca se conformou com a aprovação da lei. “Boa parte dos deputados que defendem a destruição do Estatuto foram financiados pela indústria brasileira de armas e munições. Existe um interesse econômico e político que a sociedade tem que ficar alerta”.
A famosa fala de Mahatma Gandhi, um dos maiores pacifistas da humanidade, é citada pelo coordenador do Viva Rio. “Não se pode combater violência com mais violência”.