Brasil: modelo de luta contra o tabagismo

O Brasil foi apontado pela Fundação Bloomberg, parceira da Organização Mundial da Saúde, como modelo a ser seguido por outras nações em políticas de controle ao tabagismo. O reconhecimento se deu por conta do declínio no número de fumantes no país, em consequência da atuação das mais de 23 mil equipes de saúde da família no tratamento ao tabagismo em 4.375 municípios.

Vitor Madeira_Viva Rio (19)

Moradores da Rocinha participam do grupo de tabagismo todas as quintas-feiras, na Clinica da Família Maria do Socorro

A Pesquisa Nacional de Saúde mostrou que o índice de pessoas que fumam e usam produtos derivados do tabaco é 20,5% menor que o registrado há cinco anos. No Rio de Janeiro, especificamente na Clinica da Família Maria do Socorro Santos, Rocinha, a redução pode ser percebida na prática. O grupo antitabagismo da unidade, comandado pelos odontologistas Saul Bernardo e Márcia Magdalena , registrou uma queda de 70% no número de fumantes.

Mais do que incentivar o abandono do vício, o grupo desperta o sentimento de autoconfiança nos usuários. “Mostramos que eles são capazes de parar de fumar, mas que para isso precisam assumir um compromisso”, disse Saul. O grupo existe deste 2011 e já ajudou pessoas como Curupuru Guimarães, 71 anos.

Vitor Madeira_Viva Rio (21)

Além ajudar dezenas de pessoas na Rocinha a largar o cigarro, Saul convenceu a própria mãe a abandonar o vício

“Por conta do trabalho da clínica, eu e minha mulher (Severina Valéria dos Santos) conseguimos parar de fumar. Eu estava morrendo por conta de uma dificuldade respiratória que adquiri no decorrer dos 54 anos que fumei um maço de cigarros por dia”, afirmou.

Curupuru fez parte do grupo antitabagismo da unidade em 2011, no qual aprendeu as técnicas para driblar a vontade de fumar. Livre do hábito, o usuário agora faz uso de medicamentos para controlar a  deficiência na capacidade do pulmão puxar o ar (DPOC) e enfisema pulmonar. “Aqui, o trabalho é realizado com vontade e não tenho sequer uma reclamação, pois sem eles eu não estaria aqui”.

O hábito de fumar de Curupuru – nome que, segundo ele, significa árvore grande – começou aos 14 anos, quando começou a trabalhar em um bar no Leblon, Zona Sul do Rio. “Eu tinha direito a um maço de cigarro por dia, que doideira né? Então fiquei estimulado a fumar. Forjei meu caráter atrás de um balcão, porque eu lidava com gente adulta, e olha no que deu”, ironiza.

 

Vitor Madeira_Viva Rio (11)

Residente da Rocinha há 60 anos, Curupuru largou o cigarro graças a ajuda a unidade de saúde

Curupuru se arrepende de ter começado a fumar, mas tem consciência de que não pode voltar no tempo. “Fumei 54 anos, isso fez muito mal para mim e quase me matou, mas agora tenho que reconstruir minha vida longe do vício”. Para o ex-fumante, deveria haver um tratamento contra o tabagismo para ser aplicado aos bebes ainda no útero da mãe. “Sei que pode parecer demais, mas esse hábito é realmente uma praga. ‘Meu Deus do Céu’, agora tenho um monte de doenças por que comecei a fumar”, lamenta. As mãos que antes eram utilizadas no ato de fumar, agora são a fonte de renda de Curupuru, que trabalha como cabeleireiro na Rocinha.

O grupo se reúne a cada três meses, todas as quintas-feiras a partir de 17h, sempre na unidade. Com uma abordagem ativa e pragmática, os participantes recebem o apoio de outras pessoas que também sofrem com a dependência do cigarro e são incentivadas a aplicar o que aprenderam com o grupo em vários aspectos de sua vida.

Vitor Madeira_Viva Rio (9)

As mãos que antes eram utilizadas no ato de fumar, agora são usadas para cortar o cabelo de moradores da Rocinha

Mortal
O fumo é uma das principais causas de morte no mundo. No Brasil, estima-se que cerca de 200 mil pessoas chegam ao óbito devido ao tabagismo. Atualmente, o fumo é responsável por cerca de 95% dos casos de câncer de boca, 90% do casos das inflamações de mama, 80% de câncer no pulmão, 97% de câncer da laringe, 50% de câncer de pele, 45% das mortes por doença coronariana (infarto do miocárdio) e 25% das mortes por doença vascular-cerebral (derrames cerebrais). Nos últimos dois anos, o ministério destinou R$ 41 milhões para ações de combate ao uso de tabaco.

 

(Texto: Flávia Ferreira| Foto: Vitor Madeira)

Postado em Notícias na tag .