Especialistas declaram falência da guerra às drogas

Em crítica à atual política de drogas, Ronilso Pacheco, membro da Rede Evangélica Nacional de Ação Social e Interlocutor para as Igrejas do Viva Rio, indaga: “E como chegamos aos que são, de fato, afetados pela lei?” Para ele, a legislação já teria mudado “se houvesse qualquer efeito nocivo e mortal para a população branca e de classe média”. E completa: “O que existe  hoje é uma política de cerceamento e controle disfarçada de política de guerra às drogas”, ataca.

Ronilso Pacheco diz que evangélicos não conservadores precisam ser ouvidos

Para Ronilso, a mídia também é parcial ao falar da guerra às drogas| Foto: Amaury Alves

“Manda a fumaça do cachimbo pra cachola / Acende, puxa, prende, passa.”

Falando sério, mas sem abrir mão do bom humor, o desembargador Siro Darlan  passou a palavra parafraseando os versos do rapper Gabriel, O Pensador, aos participantes do painel  Drogas, proibição e moral, no Seminário “Drogas: legalização, moral e direito”, realizado pela Law Enforcement Against Prohibition Brasil (LEAP), com os Fóruns Permanentes de Direitos Humanos e Direito e Saúde da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ).

O papel da mídia neste contexto também foi questionado. Para Ronilso, que estuda Teologia na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, ela ajuda a construir uma visão negativa dos evangélicos ao priorizar a voz dos mais conservadores e não destacar os que são a favor da descriminalização das drogas. “Fizemos um abaixo-assinado com 150 assinaturas de pastores que se dizem contra a criminalização. Há evangélicos que não querem mídia. E a mídia não os procura”, exemplifica.

Casos concretos

Segundo o advogado Paulo Cesar Malvezzi Filho, assessor jurídico da Pastoral Carcerária Nacional, a realidade nos presídios brasileiros é assustadora. “No Centro de Detenção Provisória de Pinheiros, em São Paulo, as pessoas são presas na Cracolândia, entram endividadas e são mortas lá dentro. Na Penitenciária Feminina de Santana, do outro lado da cidade, houve casos de suicídio provocados pelas organizações criminosas porque as pessoas estão endividadas, não conseguem deixar de consumir lá dentro e acabam, simplesmente, mortas”, denunciou.

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Paulo Cesar Malvezzi (esquerda) denunciou a situação caótica dos presídios| Foto Amaury Alves

Dados da Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo indicam que 70% das mulheres são presas no Estado por tráfico de drogas. Já na região Norte do Brasil, em um presídio misto, na cidade de Tabatinga, fronteira com a Colômbia, 100% das mulheres estão detidas pela mesma razão. “A convivência parecia pacífica, mas elas contam que sofrem violência sexual, estupro, são obrigadas a fazer serviços domésticos, ou seja, são tratadas como uma subcategoria de presos”, descreve o advogado.

“Segundo o promotor, se ele soltasse as mulheres, toda a cidade amanheceria traficando. Mas o detalhe é que toda a cidade já está traficando. O que justificaria a prisão delas?”, volta a indagar Malvezzi, que dá a resposta: “A única justificativa é que a guerra às drogas interessa a alguém. Alguém precisa ser preso. Numa guerra, ou você morre ou é feito prisioneiro”, aponta.

A situação se repete nos presídios de Mato Grosso do Sul e de Minas Gerais: cem por cento das mulheres estão presas por tráfico de drogas. “Em Governador Valadares houve relatos de estupros dentro do presídio. O Secretário disse que houve sexo consensual. Imagina sexo consensual com pessoas mortas, polícia invadindo… haja tesão!”, ironiza.

Em Goiânia, no Amazonas, e em Mato Grosso do Sul, a descriminalização é tema de debate entre membros da Pastoral Carcerária de Presos:  “A guerra às drogas prejudica as populações. Para nossa surpresa, o assunto com os agentes da Pastoral é fácil de ser tratado. Eles não discutem teologicamente a questão das drogas nas Arquidioceses ou nos palácios  paroquiais, mas nos presídios”,  conclui Malvezzi Filho.

(Texto Sol Mendonça|Fotos: Amaury Alves)

 

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